Coluna IRanimA

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terça-feira, dezembro 05, 2006

A história da sua estada em Lisboa é algo de tão extraordinário como de real. Claro que, para efeitos de uma narração mais cativante e de uma descrição mais floreada, certos factos podem ter sido ligeiramente (ou brutalmente) romanceados. Tenha o leitor em conta que, no seu cerne, os acontecimentos que se seguem são baseados em ocorrências verídicas.
Ela era proveniente de uma pequena cidade de interior e, tal como as suas amigas de turma, decidiu-se a vir estudar para Lisboa, essa selva de betão que, para quem está habituado ao conceito de "cidade" que se vive por esse país afora, parece merecedora de um epíteto que não o de cidade: talvez metrópole, talvez caos!
A primeira experiência que tivera, por sua conta, em Lisboa, anos antes, havia sido traumatizante. Porque em Lisboa, as regras são diferentes. Passar numa passadeira quando o semáforo dos peões está verde não invalida que sejamos passados a ferro por uma viatura apressada para a qual o semáforo também estava verde. Assim é Lisboa. Esperar pelo autocarro à hora de ponta nem sempre nos garante um lugar nele, que pode já chegar apinhado e sobrelotado. Assim é Lisboa. Entrar feliz no metro e, ao sair, reparar que o nosso telemóvel, que seguia descansadinho no fundo do bolso do casaco, se volatilizou, é normal – assim (também) é Lisboa.
Agora, mais crescida, já quase uma senhora, decidira-se a entrar numa nova vida – a de estudante universitária. Para isso, contava com o inestimável apoio de duas das suas amigas de turma, que haviam arranjado um apartamento "agradável", nas palavras delas, ali para os lados da Cova da Moura, "perto de transportes e não muito longe do metro", também segundo elas. Só que, como ela constataria, os autocarros só passavam de meia em meia hora e o metro distava trinta minutos a pé. Depois ainda tinha que mudar de linha uma vez e passar por umas quinze estações. Sim, aquele apartamento estava no centro do mundo. A Cova da Moura é que "rula", como afirmam os "dreads" e os "basofes" que habitam nesse "ghetto". Yô.
Como era a sua única alternativa, aceitou ficar com elas. Ao chegar ao apartamento, – uma velha cave, repleta de humidade e bolor em quase todas as paredes – elas ficaram radiantes e organizaram-lhe uma recepção em grande, com direito a festa de pijama e tudo. Por segurança, ofereceram-lhe uma Magnum carregada com balas de borracha, bem como um colete à prova de bala, "não fosse o diabo tecê-las". Ela, assustada, perguntou-lhes se o bairro era assim tão perigoso. Obteve uma resposta muito animadora: "Não, não é muito mau, há três dias que não há nenhum tiroteio aqui na rua, está descansada."
Assustada com aquele ambiente de motim que se parecia viver naquele gueto (perdão, bairro), não dormiu na primeira noite, mas já conseguiu dormir umas duas horitas na segunda. E só não dormiu mais porque, a certa altura, sentiu como que umas cócegas na cara. Depois sentiu-as nas mãos. Depois na barriga, por debaixo do seu pijama. Finalmente, teve essa singular sensação pelo corpo inteiro. Inicialmente riu-se e sacudiu-se mas, quando essas impressões se começaram a tornar desagradáveis, acendeu a luz da mesa-de-cabeceira para ver o que se passava. O que observou fê-la explodir num grito como nunca havia dado, tão estridente, tão forte e tão sofrido que, nas ruas vizinhas, todas as luzes se acenderam e todas as pessoas assomaram à janela, empunhando caçadeiras e revólveres, como que tentando verificar se não teria havido mais algum tiroteio. Na verdade, o que ela sentira era uma invasão de baratas, daquelas muito gordas e ascorosas, que se haviam divertido a explorar o corpo da nova ocupante da cave enquanto dormia. "Eram milhares", disse-me ela, em conversa. "E do tamanho de ratos.". Quando eu franzi o sobrolho em sinal de descrença face àquela descrição que me parecia uma hipérbole, ela corrigiu: "OK, eram centenas. E do tamanho daqueles ratinhos brancos.". Voltei a franzir o sobrolho e ela retorquiu com a descrição que me pareceu mais fiel e acertada: "Eram umas dezenas ainda. E bem grandes, nunca tinha visto baratas daquele tamanho. Mas, na verdade, nunca tinha visto baratas antes. Nem sei se eram baratas. Não tinham asas, deviam ser baratas. Ou as baratas têm asas?"
Obviamente, não ficou nem mais um segundo naquele local. Dias depois, deparou-se com uma das amigas do apartamento da Cova da Moura. Quando ia para lhe falar com um sorriso de orelha a orelha, ela virou-lhe as costas, o que deixou a minha amiga atónita e chocada. Decidida a descobrir o que se passava, tocou-lhe nas costas e perguntou-lhe que bicho lhe tinha mordido. Obteve uma resposta irada: “És uma ingrata. Tinhas um apartamento excelente e foste-te embora sem dizer água vai. Qual é o problema de umas míseras baratinhas? Nunca viste nenhumas? Fora os ninhos de ratos debaixo da cama, aquele era o apartamento perfeito e tu foste-te embora!”.
Triste sina a da minha amiga. Tinha o apartamento perfeito, se conseguisse ignorar os ninhos de rato e se domesticasse as baratas. Pobre rapariga. E o único problema dela é não conseguir lidar com insectos não-alados!

1 Comments:

Blogger Roxanne W. said...

são so umas baratinhas e ratazanas...mais coisa menos coisa e tal...e uns tiros, aliás não são tiros são foguetes por esta gente anda sempre em festa... ;) e o sexo da história onde está????n eras o gi ego????

12:34 da tarde  

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